terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Novos paradigmas



Para além das questões do vestibular, outros desdobramentos se anunciam no horizonte. A avassaladora disseminação das novas tecnologias vem provocando previsões ainda mais radicais sobre o futuro dos programas curriculares. "As TICs não afetam só o currículo, mas as próprias bases do nosso sistema educativo", defende, por exemplo, o pesquisador espanhol César Coll, um dos articuladores da reforma educacional espanhola que influenciou profundamente os parâmetros curriculares brasileiros. Para ele, a lógica que vem presidindo todas as últimas reformas curriculares é a mesma - a da acumulação e a organização disciplinar. "Contudo, as tecnologias vão implodir os currículos enciclopédicos da forma como o conhecemos, pois os programas não podem fechar os olhos para as mudanças das práticas culturais da sociedade", vaticina. "Como podemos definir hoje tudo o que os alunos precisam saber, se tudo muda em impressionante velocidade?", pergunta.

Coll assenta suas reflexões no que chama de "nova ecologia da aprendizagem". Para ele, os alunos já vivem num mundo em que a escola representará apenas uma das inúmeras possibilidades de acesso à informação, no que chama de "nichos", que são o trabalho, os cibercafés, celulares, bibliotecas, centros comunitários, casa, computadores pessoais plugados pelas tecnologias móveis. Por isso, diz, a educação deverá estar menos centrada na oferta de informações do que no desenvolvimento das competências necessárias para buscar, compreender, organizar criticamente e reconstruir as informações dentro de contextos que mudam continuamente.

Ele não está só nessa reflexão. A pesquisadora Frída Diaz, da Universidade Autônoma do México, estudou diferentes propostas de revisão curriculares e identificou tendências comuns, como a flexibilidade, a formação prática, a opção por temas transversais, o foco na aprendizagem do aluno e o uso de novas tecnologias. Outra das constantes encontradas também vem provocando bastante polêmica: o foco no desenvolvimento de competências, que se tornou um mantra para os que questionam os currículos baseados em conteúdos.

Para Elba, da Fundação Carlos Chagas, trata-se de uma discussão repleta de mal-entendidos. "As competências não existem, nem se criam no vazio. É preciso haver conteúdo para desenvolver competências", defende a pesquisadora, indo ao encontro da visão de Fabio Aidar. Para ela, embora de fato seja preciso haver mudanças no currículo, não se pode esquecer que muitas coisas permanecem. "A sociedade muda, o conhecimento muda, a escola tem de estar atualizada, por exemplo, no que se refere à mídia e às tecnologias, que trazem novas formas de acesso ao conhecimento", diz. "Mas tudo o que vem por esses caminhos ainda precisa passar pelo crivo reflexivo, definidor de relevâncias, que é o trabalho da escola", argumenta. Para a pesquisadora, o conceito de competências vem sendo utilizado muitas vezes de forma restritiva e utilitarista, no sentido de saber fazer algo. "Mas a escola é o espaço que ensina a ser, cultiva gosto, afetividades, preferências, oportunidades para o desempenho da cidadania, tem um escopo maior, portanto, na formação integral dos indivíduos", diz.

No centro de todas as discussões, está o professor, que se apega aos documentos oficiais, como as diretrizes curriculares, aos livros didáticos e aos programas dos vestibulares como bússolas num mar tempestuoso, onde ainda parece melhor pecar pelo excesso do que pela falta. Por contraditório que possa parecer, o caminho possível entre tantas referências obrigatórias é o da autonomia - da escola e de seu projeto pedagógico. "A profusão do conhecimento não é uma vantagem em si. O que cabe a nós, principalmente, é ajudar nossas crianças e jovens a compreender os fenômenos, a duvidar, a fazer perguntas, a experimentar. Se olharmos apenas para as teorias, acabamos por ignorar o que temos a nossa frente, os alunos reais", conclui.

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